À beira da pausa anual, alguns temos este privilégio de dias para nós a que chamamos férias, dou comigo a refletir sobre o passado recente e o momento atual. Dou conta que já passaram duas dezenas anos em que todas as semanas tento tocar os leitores do Diário do Sul com alguma coisa que valha a pena. O que penso e escrevo é decorrente do meu “nível de consciência”. Aqui não há volta a dar e não há mentira possível, escrevo o que sou. Por isso qualquer leitor, mesmo que só me tenha lido duas ou três vezes, sobre água, ambiente, turismo ou o que seja, provavelmente já não terá grandes surpresas. Isto é, neste tempo de valores às vezes confusos, está aqui uma criatura muito conservadora na convicção da mais – valia de muito do que ficou lá para trás. Na primeira linha ponho a família e tudo o que de bom lhe está associado.
Confesso-vos que também aqui terei que assumir alguma eventual contradição quando o meu conceito de família vai alguma coisa para além da convencional “ligação parentesca”; a “minha” família assenta essencialmente em “laços afetivos” temperados em valores, crenças e atitudes. Chamem-lhe o que quiserem mas esta foi a forma, a mais das vezes, inconsciente que tive de ultrapassar o “deficit de família” que tenho sentido ao longo da vida. Por ora tento andar por paisagens de horizontes mais largos e levar os tais “laços afetivos” bem mais longe. Se sinto, cada vez mais, afeto pela andorinha que faz o ninho no meu beiral, o que sinto por um meu semelhante que até não conheço mas que necessita da minha atenção? Suspeito que a expressão “estamos todos no mesmo barco” é bastante mais verdadeira e profunda do que há primeira vez possa parecer. Provavelmente todos temos muito mais a ver uns com os outros do que imaginamos. Se isto for verdade, tenho que escrever que a Humanidade está no lado oposto aquele em que deve estar, isto é, ninguém se pode sentir confortável sabendo que há cada vez mais semelhantes com carências de tudo o que é essencial. Embora possa não parecer vem também a propósito a Alexandra, uma ucraniana que há uns anos pertenceu à minha família e muito a ajudou. Depois de ter regressado a casa e de ter trabalhado por outros países soube qua a Alexandra está de novo em Portugal para ficar. Não falei com ela mas arrisco em afirmar que esta sua decisão tem a ver com a família ucraniana que tem em Portugal mas também com a outra. Sei, sem grande margem para erro, que também pesou na sua decisão de regressar tudo aquilo que somos como portugueses. Esta é uma boa terra e no essencial é habitada por gente que vale a pena. Julgo que será também por isto que os nossos emigrantes nesta altura do ano não prescindem da estadia na terra mesmo que já sejam muitas dezenas de anos lá fora. E o mais curioso, como há um ano observei, é que estrangeiros que acompanham estes nossos emigrantes nas suas férias revelam-se enormes admiradores desta “nossa” terra e das suas gentes. Provavelmente a nossa autoestima coletiva merecia andar mais alta com tudo o que isso tem de bom.