O que aqui hoje escrevo passa-se no Alentejo mas acredito que também um pouco por todo o país.
Num almoço muito tardio em Évora saboreei uma magnífica poejada de bacalhau e ovo cozido. Quase em jeito de sobremesa, logo que saí do restaurante deparei com um outdoor, também ele tardio uma vez que respeita a um evento de maio de 2014. Anuncia-se um Festival de Ervas e Chás do Mundo a decorrer em Beja e Mértola.
Não está em causa a bondade da conhecida associação de desenvolvimento local que organizou o evento, muito menos o programa de desenvolvimento regional (dinheiros públicos) que apoiou financeiramente o evento, está em causa tudo. Não sei, nem quero saber, mas suspeito, das razões que levam às ervas do mundo em vez das Ervas do Alentejo. Como se o Alentejo nesta matéria levasse lições ou ensinamentos de alguém. Como se algum alentejano se interessasse pelas ervas do mundo, ou como se fizesse algum sentido falar das ervas do mundo em Beja. Que ervas e mundo são estes? O mais curioso é que se fizermos uma rápida leitura dos objetivos do evento e do vasto e rico programa continuamos a não compreender o porquê das ervas do mundo.
Todo o festival foi o que devia ser, Ervas do Alentejo. Na prática, o que nos interessa focar é que enquanto este tipo de coisas acontecer dificilmente as nossas terras e regiões assumem a sua identidade e tiram valor sustentável e duradouro dos nossos recursos materiais e imateriais. É também por estas, e por outras deste tipo, que se tem gasto muito dinheiro sem resultados. Os estudos, as estratégias, os eventos e as iniciativas sucedem-se, multiplicam-se e sobrepõem-se e o resto pouco importa. Até porque a narrativa de justificações e indicadores está perfeitamente estabilizada e é pacificamente aceite e tolerada pelas partes, incluindo as entidades reguladoras e financiadoras. No fim já sabemos que andamos todos, uns mais que outros, na lamúria da crise à espera que alguma coisa mude por si.
O nosso dever é acreditar no que somos, nos recursos que temos e mudar de atitude. Responsabilizar, comprometer e trazer à razão quem persistir no equívoco. Já não há paciência para que assim não seja.
É necessário que o país faça uma clara gestão dos dinheiros públicos que tenha em conta a sustentabilidade e vise resultados.
Os nossos recursos e a nossa cultura são únicos, devem ser assumidos e valorizados. Exemplos como este que aqui citei não podem acontecer, alguém tem que dizer não e corrigir sempre que necessário. Só assim podemos melhorar o país onde nascemos e vivemos.