Neste tempo em que tudo aponta para o turismo talvez seja oportuno (re)visitar o Guia de Portugal (1927).
Felizmente vamos tendo umas Fundações que muito para além de cumprirem o seu objeto enriquecem, e de que maneira, este país. No caso presente a Fundação Calouste Gulbenkian reeditou o texto integral que reproduz a 1ª edição do Guia de Portugal pela Biblioteca Nacional de Lisboa em 1927. São oito deliciosos volumes que agora mesmo estão a preço de Natal. Todas as casas portuguesas deviam ter esta obra, um hino há nossa memória e identidade. Bem sabemos que para alguns, demais, “memória e identidade”, é algo estranho e mesmo absurdo. Sobre o monte alentejano pode ler-se “…é um modelo de hospitalidade e asseio. Lá dentro a mesa é franca e a chama da lareira aquece todos os que chegam.” Tem a ver connosco. Gozamos de “uma beleza própria, embora só uma longa intimidade com a sua paisagem a permita apreender”.
Os tais, nem que cá passem a vida toda apreendem alguma coisa que valha a pena, piores são mesmo aqueles que cá nasceram, mas cegos, e que assim permanecem até ao fim. Uma nota muito curiosa é o comboio como meio de transporte para conhecer Portugal; referência a comboios rápidos, mistos e correio, bem como à 1ª e 2ª classes. A discrição dos lugares vai a uma escala de grande proximidade, hoje inexistente. No que respeita a Évora é muito obvio perceber a importância da cidade, que hoje não tem. Chegados de comboio, “desemboca-se numa extensa e larga avenida orlada de plátanos (Avenida Barahona), que a certa altura se expande num vasto terreiro (Rossio de S. Brás), plantado de olaias, acácias e amendoeiras.” Uma muito vaga semelhança com a bandalheira que hoje conhecemos. Mas o que me salta à vista é o Jardim Público, “vasto recinto com lagos, avenidas de ciprestes, amoreiras, plátanos e pimenteiras afogadas em tufos de era…”. A descrição é longa e pormenorizada, transporta-me 150 anos para trás, quando Eça por aqui andou e se referia ao Passeio Público, pago. Imagine-se que nessa altura Évora tinha um passeio público de tal maneira valorizado pelos eborenses que pagavam para o gozarem. A própria Praça do Giraldo, hoje habitualmente com barracas a pretexto de qualquer coisa, tinha essa função. Parece pura ficção. Muito para além da descrição física da cidade o Guia inclui a caracterização socioeconómica e lista os serviços existentes. Fiquei a saber que Évora tinha dois hotéis modestos, o Eborense (Largo da Misericórdia) e o Delca (R. Luís de Camões) e a hospedaria Jacinto Garcia (R. da República). Muitas ilustrações e plantas enriquecem a obra. Por último, a titulo de exemplo, a partir de Évora é possível ler a descrição e visitar todo o Alentejo, lugares, vilas e aldeias. Guia de Portugal, um excelente presente de Natal para si e família, como eu fiz.