pagar o sol

Três assuntos distintos, mas só aparentemente, motivam o meu escrito desta semana.

O sucesso das startups, palavra, e não só, que nos invadiu por todo o país e que me tira do sério. As startups, para os felizes que não sabem, são as eventuais empresas do futuro que se criam no presente supostamente garantindo a sustentabilidade do país e das cidades. Querem-me fazer crer que um contentor cheio de putos com portáteis a inventar tretas se traduz na riqueza e bem estar das pessoas? Portugal, Braga, Évora (?), etc. estão na moda das startups. A minha desconfiança é porque não me dizem quem vai plantar as couves e regar as laranjeiras? Confesso que não procurei muito, mas ainda não consegui encontrar um destes maravilhosos projetos que tratasse do mais essencial: água e alimentos. Em frente.

Parece que não tem nada a ver, mas tem. São os sinais dos tempos, o faz de conta. A Câmara Municipal da maravilhosa cidade de Tomar anuncia no seu boletim mensal de outubro (Tomar Nota, nº 42)  o mês da cidadania, igualdade e solidariedade. A imagem conveniente (?) associada é a de uma idosa (e os homens idosos? Será que a Mariana vai gostar?). A minha questão básica é: onde estão a cidadania, a igualdade e a solidariedade nos outros 11 messes do ano? Lendo o extenso e diversificado programa de atividades do mês, bem se compreende que, na verdade, o mês podia ser outra coisa qualquer da moda ou não: crianças, bébés, alimentação, desporto… Já não há pachorra para estes estratagemas de comunicação. O dia real dos idosos e de todos os outros, até dos homens do sexo masculino, com licença da Mariana, é bem diferente. A cidadania, igualdade e solidariedade, seja qual for a condição ou idade de cada um (ou uma, não vá a Mariana ler-me), são um dever; desenganem-se os que ainda pensam em direitos do cidadão. Bem luto pelos meus direitos, cada vez mais ténues, mas sei claramente que os meus direitos assentam e dependem totalmente do cumprimento dos meus deveres. Será que a generalidade dos portugueses já compreendeu isto? Seja como for, os nossos gestores (políticos) locais e nacionais insistem em só nos falarem em direitos – é a forma mais fácil de nos enganarem.

Por último, o imposto do sol. Pensava eu, e sempre verdadeiramente acreditei e trabalhei para isso, que “o sol quando nasce é para todos”. O, hipotético, novo imposto sobre os benefícios da exposição solar vem evidenciar que os antecessores da geringonça estavam enganados quando afirmavam que o sol é de todos. Afinal, o sol é só de alguns e isso tem de ser pago, a bem da justiça social. A estupidez atingiu níveis nunca antes vistos. Ou será que esta e outras tais são para nos distraírem? Não creio. Um país com a geobiodiversidade e o clima como Portugal tem, que proíbe acampar no campo, é estupidamente ilimitado e por isso pagar o sol é uma ideia bem possível. Esta é a verdadeira e mais grave pobreza: o direito ao sol e o dever de o pagar. Será que a Mariana tem alguma ideia de como sair desta miséria?

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Adaptado de Esquire, de Matthew Buchanan