“A forma como nós lidamos com o tempo é anómala porque deixámos de ter tempo. O tempo é uma invenção humana, mas nós nunca temos tempo. [Urge] Uma reconciliação profunda com o tempo, com os ritmos mais humanos, com a necessidade do descanso, do repouso, da sedimentação, para que cada um de nós possa sentir-se habitado, sentir o sabor das coisas pequenas, …” É um excerto de uma entrevista de J. Tolentino Mendonça, um dos grandes pensadores e poetas dos nossos dias. Muitos dos leitores de O Mirante leem o semanário nacional onde Tolentino Mendonça escreve todas as semanas. Algumas dessas crónicas semanais sobre a vida de todos os dias estão compiladas no livro, “Que coisa estranha são as nuvens”, que nos convida a parar e a “simplificar adensando” o modo de viver a vida. Para além de tudo, estamos perante um mestre de humanidade. Ler Tolentino Mendonça é esbarrar na simplicidade da vida que tanto gostamos de complicar.
Independentemente da crença, ou da religião de cada um, Tolentino Mendonça é uma referência e um pilar da cultura contemporânea portuguesa. “Ler as páginas de Tolentino é realizar uma experiência de amizade. As suas palavras são palavras privadas ditas em público. São acolhedoras porque mantêm a raiz profunda da experiência e abrem a um diálogo em que o leitor se sente protagonista”, escreve Antonio Spadaro, diretor de La Civiltà Cattolica (Itália). Na verdade as palavras e as ideias em Tolentino Mendonça assumem uma dimensão e um sentido únicos; até o mais complexo dos temas ganha uma simplicidade e clareza que nos conforta e ajuda nos grandes desafios, tanto quotidianos quanto existenciais. É esta vocação quotidiana, prática, local, próxima e pessoal que me leva a escrevê-lo aqui. Nestes tempos de grandes desafios globais e pessoais, pensadores como este ajudam-nos muito. Cada vez estou mais convicto que os passos civilizacionais em frente, de que tanto necessitamos, só são possíveis se acrescentarmos “nível de consciência” às nossas ações.
Na verdade, digam-me se há assim uma tão grande diferença entre o terrorismo de Paris e o terrorismo da VW ou do rio Doce no Brasil? Vivemos num tempo de transição, necessariamente para comunidades mais respeitosas, autênticas e sérias. Neste enorme desafio, a unidade comunitária local é aquela que melhor responde. As pessoas conhecem-se, respeitam-se e ajudam-se, dão tempo umas às outras, ouvem-se e compreendem-se. Só teremos novos e melhores tempos com homens e mulheres que assumam valores éticos e morais muito superiores aos atuais. Dê uma vista de olhos ao que Tolentino Mendonça escreve porque isso o vai ajudar, Feliz Natal.