mais seca

No início de abril escrevi aqui sobre o “verão de abril”, isto é, sobre a seca.

Agora que alguns da esmagadora maioria urbana, para quem o ciclo da água é uma torneira por onde sai a água e um ralo por onde ela se escoa, começam a ouvir falar da seca, volto ao tema. Até porque esteve em curso até 21 de agosto a discussão pública sobre o Plano Nacional da Água e ninguém pareceu ligar. Será possível que tão vital tema nos passe ao lado? E se a anunciada seca for mesmo a sério? Tanto brado sobre o Tejo e quando devemos dizer alguma coisa, o que fazemos?

Vem tudo isto a propósito de, nas férias cá dentro, ter andado pela seca e pelo país seco; são coisas diferentes. Logo em abril, quando escrevi, impressionou-me a seca que vi no Caramulo e foi essa a essencial motivação do meu escrito de então; quando o país de Lisboa, dos jornais e TV, ainda não tinha dado por tal. Agora, em setembro, o que me motiva a escrever sobre o assunto foi o país seco. Refiro-me obviamente ao país húmido, onde a seca se faz efetivamente sentir, e ao país seco onde a seca, de tão normal, é uma palavra estranha. Isto não significa que no Alentejo ou na Beira, designadamente a pecuária, não exija uma gestão mais atenta e mais custos, desde logo muito aproveitados para a habitual lamúria.

Na verdade, na serra da Lousã os montes e os vales choram de dor pela falta de água. Dá dó sentir o stress de toda aquela vegetação, ver os riachos secos e os musgos amarelos. Enquanto isto, no Alentejo que nunca teve tanta água como agora (Alqueva), falar em seca é estranho, como me mostrou um primo agricultor de Campo Maior: “aqui não, nunca temos água nesta altura do ano e apesar de não chover desde janeiro não temos seca, sempre assim é”. Este “surpreendente” comentário transportou-me 20 anos para trás (1994/95). Nesta época também houve seca e a propósito ouvi um velho e sapiente agricultor de Serpa dizer que a seca não o afetava: “no inicio do ano percebi que o ano ia ser seco, programei as minhas culturas para essa realidade e agora a água que tenho chega”. Tanto saber.

Há dias, quando cheguei a Campo Maior, com cerca de 40° C e o que vi foram aspersores a regar relvados. É chocante e estúpido. Até quando este país se vai dar ao luxo de esbanjar recursos, estragar dinheiro? É tempo de acabar com a cultura do relvado que serve apenas para os cães fazerem as necessidades. Se não o fizermos rapidamente, um dia destes a mãe natureza vai bater-nos à porta e pedir-nos contas. Já devemos saber que o preço dessas contas é elevadíssimo. Este exemplo da relva é apenas um entre muitos.

Artigo de abril: http://www.otrosmundos.cc/2015/04/seca/

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Adaptado de Esquire, de Matthew Buchanan